A meta de redução dos benefícios tributários será cumprida dentro do prazo, mas ainda é insuficiente para as contas públicas, afirmou a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, durante a audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), nesta terça-feira (19). Tebet tem focado nos chamados gastos tributários, provenientes de isenções e renúncias fiscais, que ultrapassam meio trilhão de reais e, segundo a equipe econômica, comprometem o desempenho das contas públicas.
A Emenda Constitucional (EC) 109, de 2021, determina que o poder público diminua até 2029 descontos na cobrança de tributos de modo que o valor que deixa de ser arrecadado corresponda no máximo a 2% do Produto Interno Bruto (PIB). Segundo Tebet, os incentivos tributários previstos na Constituição Federal, como o da Zona Franca de Manaus, devem ficar de fora da conta. Assim, a parcela real equivale a 2,3% do PIB em 2024, com apenas 0,3 pontos percentuais a serem reduzidos nos próximos anos.
— Nós estamos fazendo o dever de casa. Estamos cumprindo a emenda constitucional, por incrível que pareça. A regra foi boa, mas é absolutamente insuficiente para resolver o problema dos gastos tributários […]. Independente de falar de corte ou não, [devemos] otimizar os gastos tributários. Essa é a grande mensagem que eu gostaria de deixar, porque pior do que gastar muito é gastar mal — disse a ministra.
Os benefícios tributários totais foram de R$ 563,5 bilhões em 2024, dos quais R$ 266,8 bilhões são sujeitos à limitação da EC 109, segundo a ministra. Entre esses gastos estão as renúncias fiscais como incentivo a diversos setores da economia, as isenções e deduções de rendimentos do Imposto de Renda de Pessoa Física. Também é o caso do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), benefício para o setor de eventos criado na pandemia da covid-19 e que foi recentemente estendido. Em 2024, Tebet e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmaram que o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, estava preocupado com o crescimento desses benefícios, que reduzem a arrecadação governamental.
Para ela, as discussões na Câmara dos Deputados para diminuir pelo menos 10% dos subsídios da União em até dois anos são “um bom ponto de partida”, mas não “um ponto de chegada”. As medidas devem aumentar a arrecadação “em torno de R$ 20 bilhões”, o que equivale a todo o gasto federal autorizado em 2025 para ciência e tecnologia. Os projetos de lei complementar (PLP) 41/2019, do senador Esperidião Amin (PP-SC), e 128/2025 serão analisados em regime de urgência pelos deputados.
Ajuste das contas
Para o presidente da CAE, senador Renan Calheiros (MDB-AL), o equilíbrio do orçamento pode vir pela redução dos benefícios tributários, mas também deve vir pelo corte de despesas e pela rigidez nas regras que impedem o governo de gastar mais do que arrecada. Ele acusou o governo federal de contornar o Novo Arcabouço Fiscal como “rotina”.
— Redução dos subsídios, revisão dos contratos, venda de ativos imobiliários e aplicação do teto salarial. Como todos sabem, nunca se fez no Brasil uma racionalização do gasto público. Acho que hoje, mais do que nunca, precisamos fazê-la. Não é uma opção, é uma obrigação — disse Renan, que requereu o convite à ministra.
“Bomba bilionária”
Tebet apontou que as decisões do Poder Judiciário que geram novos gastos obrigatórios e imprevisíveis para o governo são causas relevantes no desequilíbrio orçamentário. Para ela, isso diminui os recursos que podem ser aplicados em políticas públicas de forma flexível (despesas discricionárias). O orçamento enviado estimado pelo governo para 2024, por exemplo, tinha 91,6% das despesas obrigatórias, com destino já carimbado.
— Precisamos ter muito cuidado com o judiciário assistencialista. Acho mais do que louvável que a mulher, mesmo que não tenha contribuição previdenciária, tenha direito à licença-maternidade, só que isso chegou [do Judiciário] do nada. Estou falando, de forma conservadora, de R$ 12 bilhões. Agora, vem do Judiciário que mulheres vítimas de violência, que não têm direito ao auxílio-doença ou mesmo acidente, vão ter direito ao Benefício de Prestação Continuada [BPC]. É mais uma bomba bilionária nas nossas costas, e elas vêm, em um atropelo, dentro de um orçamento absolutamente restritivo.
A ministra ainda afirmou que os debates sobre a revisão do Fundo Constitucional do Distrito Federal não avançam. Também disse que “dois pacotes modestos de revisão de gastos” apresentados por Lula sofreram restrição ao serem aprovados no Congresso Nacional. O pacote de corte de gastos de 2024 trouxe novos limites para os gastos públicos em caso de déficit primário, limitações aos supersalários e endurecimento das regras de acesso ao BPC.
O Senado pode votar na quarta-feira (20) a PEC 66/2023, que limita o pagamento de precatórios (gastos oriundos de decisões judiciais) por estados e municípios e que pode ajudar o governo federal a cumprir a meta fiscal ao retirar parte desses gastos do teto de despesas.
Revisão de benefícios
Para tornar os benefícios tributários mais eficazes, Tebet defendeu a revisão daqueles que não mais favorecem a sociedade. Como exemplo ela apontou que a volta da cobrança de PIS e Cofins sobre os combustíveis em 2024 foi responsável por aproximar o limite de benefícios tributários da meta. Com os tributos, o governo arrecadou R$ 31,2 bilhões em 2024. O valor é maior que o autorizado no orçamento de 2025 para as áreas de saneamento básico, segurança pública e de atividades legislativas somadas.
— Foi necessário por um tempo; ele atendia ao interesse público no momento da pandemia. Agora, ele não atende mais. Muitas vezes, a gente tem que trocar benefícios tributários que eram eficientes e visavam ao interesse coletivo no passado e que não mais produzem efeitos para a sociedade brasileira por novos subsídios que são relevantes para a população […] Nós temos aqui medidas que faltam: talvez um novo arcabouço legal para combater fraude, combater ineficiências…
Já o fim de tributos federais sobre o pagamento dos funcionários dos municípios brasileiros, iniciado em 2024, levou o governo a perder R$ 10,6 bilhões em arrecadação.
O senador Rogério Carvalho (PT-SE) defendeu que até os benefícios previstos na Constituição devem ser revisados.
Conceito
Os subsídios são instrumentos para reduzir o preço ao consumidor ou o custo ao produtor. Se dividem em três modalidades:
os benefícios tributários, que diminuem a receita do governo, como o tratamento favorável aos microempreendedores individuais (MEI) e anistia de tributos;
os benefícios fiscais, em que a União transfere recursos aos beneficiados, como ocorre com bolsas acadêmicas e aportes no Minha Casa, Minha Vida. Esse tipo de benefício aumenta os gastos do governo e é considerado na meta fiscal;
os benefícios creditícios, em que a União barateia o empréstimo a determinados beneficiados por meio de fundos e programas de crédito, como ocorre com o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) e fundos de desenvolvimento regionais. Normalmente são considerados um gasto que desequilibra o orçamento do ano (ou seja, são despesas financeiras), mas afetam a dívida pública.
Fonte: Agência Senado